A descoberta de petróleo e gás em Moçambique é por muitos considerada um fundamental ponto de viragem na economia do país. Embora o ambiente de negócios, neste sector, esteja marcado de alguma forma pela incerteza devido a razões de segurança e recentemente pela pandemia do coronavírus, acredita-se actualmente que Moçambique deverá tornar-se num dos maiores exportadores de gás natural liquefeito (GNL) na próxima década.
A pesquisa e prospecção de hidrocarbonetos em Moçambique data desde os finais dos anos 50 do século passado, tendo o primeiro depósito de gás sido descoberto em 1961 e a primeira produção comercial iniciada em 2004, pela Sasol, na província de Inhambane, com reservas comprovadas de 2,6 trilhões de metros cúbicos (TCF) e um investimento estimado de 1,4 bilhão de dólares.
Sendo verdade que a história da indústria extractiva no sector de petróleo e gás em Moçambique já conta com algum legado, os números das recentes descobertas são, de longe, superiores a todo o investimento previamente realizado no país. A título de exemplo, só a área 1, na bacia do Rovuma, liderada pela Total S.A. espera construir até seis fábricas de GNL, sendo que as duas primeiras fábricas alcançaram a decisão final de investimento (FID) em 2019 no valor de 23 bilhões de dólares.
A criação de infraestrutura de extracção, processamento, liquefação e armazenamento do gás natural já levou a grandes investimentos em antecipação. A crise provocada pelo coronavírus em meados de 2020 levou a atrasos no desenvolvimento do campo de gás Mamba na área de concessão da Área 4, que foi desenvolvido por um consórcio liderado pela empresa norte-americana ExxonMobil. Há também o menor Campo Coral, também na Área 4, que está a ser desenvolvido desenvolvido em consórcio com a liderança da italiana Eni.
Ainda no ano passado, a Total anunciou oportunidades de negócios do Projecto Golfinho/Atum para os próximos 6 meses. O projecto prevê realizar contratos com empresas locais no valor de cerca de 2.5 bilhões de dólares, tendo sido realizado até ao momento cerca de 28% deste montante. Das oportunidades apresentadas, destacam-se a instalação de GNL (onshore), a construção e instalação de sistemas sub-aquáticos (offshore) e a construção do aeródromo de Afungi, e mais oportunidades de negócios nas áreas de serviços de tecnologias de informação, transporte, saúde, catering e segurança.
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Petróleo e gás em Moçambique, também para consumo interno…
O Governo moçambicano determinou que uma parte da produção de gás natural deve ser utilizada localmente para atender às necessidades do mercado interno, o Instituto Nacional do Petróleo (INP) organiza concursos para identificar empresas interessadas em desenvolver projectos industriais. Em 2016, a norueguesa Yara International recebeu uma alocação para produzir 1,2-1,3 milhões de toneladas por ano de fertilizantes. Para além dessa companhia, a Royal Dutch Shell ganhou a concessão de uma fábrica de gás liquefeito (GTL), produzindo 38 milhões de barris por dia (MB/d) de combustíveis líquidos, como diesel, nafta e querosene. Finalmente, um grupo queniano, GLA, obteve a concessão para construir uma usina de 250 MW.
No entanto, apesar do optimismo inicial, é importante ressaltar que muitos destes investimentos estão ou parados ou a “meio gás”, devido ao coronavírus e fundamentalmente por razões de segurança. A petrolífera francesa Total S.A anunciou um atraso mínimo de 12 meses, o que adiará o início do projecto de US$ 20 bilhões pelo menos até 2025. Razões de segurança, nomeadamente os ataques dos insurgentes em Palma, Cabo Delgado, prejudicaram os planos da Total e da Exxon Mobil, que também têm um projecto de GNL em Moçambique, de transformar o país num grande produtor de GNL para rivalizar com Austrália, Catar, Rússia e Estados Unidos da América. A decisão da Total S.A de invocar força maior é vista como um golpe à economia moçambicana, sobretudo para as PME’s, uma vez que a empresa não cumpriria as suas obrigações contratuais durante o período em que esse estado estiver em vigência, e também às pretensões de Moçambique de se posicionar como um player importante do mercado energético mundial. Ao mesmo tempo, esta interrupção ocorre num momento em que as principais empresas de energia reavaliam a sua abordagem ao GNL, antes visto como o combustível do futuro porque tem emissões mais baixas do que o carvão ou o petróleo, mas que agora está sob escrutínio na tentativa de cortar as emissões de carbono ainda mais profundamente.
Especialistas do sector de petróleo e gás, no entanto, prevêm que com esta interrupção forçada e, igualmente, a crise gerada pelo Covid-19 as empresas locais têm um ponto a seu favor: com a disrupção causada pela restrição na movimentação de pessoas e bens, a indústria do petróleo e gás vai ficar cada vez mais colaborativa e joint ventures com empresas locais poderão tornar-se tendência para fazer face as limitações de movimentações e com oforma de garantir a continuidade das operações. Neste sentido, o tecido empresarial pode aproveitar este tempo de pausa forçada e acelerar as suas capacidades de produtividade e competitividade para responder aos padrões que a indústria exige.
Os últimos acontecimentos marcados por uma crise energética, sem precedentes, nos países mais industrializados, sobretudo na Europa, China e Estados Unidos e a falta de uma alternativa prática viável ao gás pode, entretanto, criar condições para acelerar o processo de retoma em alguns projectos de petróleo e gás em Moçambique, desde que garantidas as necessárias condições de segurança. Analistas ligados ao sector indicam que se, neste tempo, os esforços forem de providenciar capacitação e preparação intensiva do empresariado local, quando houver a retoma e novos concursos forem lançados, será possível ver empresas moçambicanas em joint ventures nos principais projectos de investimento previstos no sector.
Além disso, a política do governo é maximizar o uso de gás produzido no país para criar desenvolvimento económico e industrial em Moçambique, dando um ponto de partida em uma indústria local de consumo de gás. Até agora, Moçambique concedeu licenças para distribuição de gás em Vilankulo e Inhassoro, perto dos campos de gás de Temane, e nas regiões da Matola e Machava, que são a principal área industrial do país. Portanto, ainda há espaço para estudar outras oportunidades de negócios nas áreas de petróleo e gás para uso industrial, comercial e doméstico em Moçambique.
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